O voo da American Airlines 2300 que tinha partido de Chicago com destino a Dallas, nos Estados Unidos, no passado dia 3 de março de 2020, acabou a fazer um desvio não programado. Pouco tempo depois de ter descolado, sem uma aparente razão, um dos passageiros descontrolou-se de tal forma que obrigou a tripulação a tomar medidas drásticas, amarrando-o até o avião pousar e ser detido formalmente pela polícia.
O descontrolo do passageiro agravou-se particularmente quando se dirigiu a uma das portas do avião com o objetivo de a abrir a mais de 30 mil pés de altura.
O caso é grave, mas não é inédito e é encarado pelas autoridades como um crime grave que atenta contra a segurança aérea e põe em causa centenas de vidas.
Prova disso é o caso de Chloe Haines, uma britânica de 26 anos que está presa há dois anos por ter tentado abrir a porta de um avião em pleno voo. Haines estava alcoolizada quando embarcou no avião da Jet2 procedente de Londres e com destino à cidade turca de Dalaman. Completamente enraivecida, avançou em direção a uma das portas com o objetivo de a abrir enquanto gritava “vou matar-vos a todos”.
Na sentença que levou esta britânica à cadeia, o juiz justificou a pena pesada com a “angústia e sofrimento” de todos os passageiros que presenciaram a situação, confinados num espaço fechado sem poderem reagir. O tribunal acrescenta ainda que Haines terá colocado em risco a vida de centenas de passageiros. Mas será que a vida dos passageiros deste voo europeu e do voo americano estiveram alguma vez em risco porque dois passageiros tentaram abrir uma das portas?
A resposta a esta pergunta não pode ser dada sem se ter em conta que, de facto, estes problemas põem em causa a segurança aérea, uma vez que perturbam o normal funcionamento do voo. Mas também é verdade que nem o passageiro do voo da American Airlines, nem a passageira do voo da Jet 2 teriam capacidade para abrir uma porta de avião. E há dois motivos que sustentam esta afirmação.
Em primeiro lugar as portas dos aviões são trancadas pelo comandante no cockpit. Depois de serem fechadas e se iniciarem os procedimentos de taxi em direção à pista passa a ser impossível que qualquer pessoa, incluindo os elementos da tripulação, as consigam abrir.
Este é um mecanismo de segurança que evita que um erro possa levar, ainda que acidentalmente, à abertura de uma porta depois de a manga ou as escadas terem sido afastadas. As aeronaves são altas e a abertura de uma porta, mesmo em terra, pode levar a uma queda com consequências graves. Ainda assim, e apesar de todos os mecanismos de segurança, todas as saídas de emergência e até as portas principais estão preparadas para serem abertas quando uma evacuação for necessária.
Mas se em terra ainda pode haver uma possibilidade remota de alguém dentro do avião conseguir abrir uma das portas (no caso improvável de o piloto se esquecer de as trancar), em pleno voo é humanamente impossível, podendo a pressurização da cabine explicar porquê.
Em primeiro lugar é preciso perceber-se como funciona a generalidade das portas dos aviões. Trata-se de um sistema que obriga a que a porta, quando fechada, seja empurrada para dentro e só depois para fora antes de se abrir., exatamente como acontece com uma panela de pressão.
E exatamente como numa panela de pressão, a força de dentro para fora que existe numa cabine, torna humanamente impossível conseguir a força necessária para que a porta faça o movimento inicial em direção ao interior do avião, abrindo-se de seguida. No fundo a pressão alta que existe dentro do avião está constantemente a empurrar para fora todos os materiais, daí a necessidade de os aviões serem construídos sem a mínima fragilidade. Um parafuso mal apertado, pode ser suficiente para iniciar um processo de desgaste rápido.
A regra da pressão aplica-se também às portas de emergência sobre as asas. Neste caso o processo é ainda mais fácil de explicar porque a abertura é feita integralmente para dentro, sendo que quando abertas as portas soltam-se da fuselagem, tendo que ser atiradas para a rua. Este é um processo que exige alguma agilidade, pelo que os passageiros sentados nas filas de emergência recebem instruções específicas da tripulação para o caso de alguma coisa correr mal. Também por isso, pessoas com capacidades físicas limitadas ou crianças não podem viajar nestes lugares.
Tal como as portas principais, não é possível abri-las durante o voo, mas em terra o cenário já é diferente. Não havendo nenhum mecanismo que as prenda, são facilmente abertas, tendo já havido casos em que voos foram adiados, precisamente porque um dos passageiros decidiu abrir uma dessas portas. Um dos casos mais mediáticos aconteceu em 2018, no aeroporto Málaga, quando um passageiro cansado de esperar pelo desembarque abriu a porta de emergência do avião da Ryanair, acabando detido pelas autoridades espanholas.
Importa ainda referir que também há modelos de aviões em que as portas não têm mecanismos de abertura para dentro, pelo que a pressurização não pode ajudar a manter as portas fechadas. Nestes casos, existe um travão elétrico que é acionado automaticamente, assim que o avião atinge uma determinada velocidade.