Um dos dramas criado pela redes sociais é a propagação de conteúdos falsos que, não tendo adesão à realidade, acabam por circular de forma exponencial, chegando a milhares de pessoas. Se é certo que em muitos casos quem partilha toma aquela informação como certa por desconhecimento ou simples ingenuidade, também há quem o faça deliberadamente. Com objetivos políticos ou até financeiros (conteúdos muito partilhados podem gerar ganhos em publicidade), as fake news são difíceis de combater e ajudam a perpetuar mitos e teorias da conspiração como as que estão associadas ao rasto branco deixado pelos aviões e que são facilmente visíveis a partir do chão.
Recentemente, uma utilizadora do Facebook gravou e publicou um vídeo que começava com a câmara apontada para o céu. No plano aparecia um avião, suficientemente distante para que fosse apenas um ponto branco lá no alto. Mais evidente era o rasto que ficava para trás. Duas linhas brancas, bem carregadas, saíam dos motores e ali ficavam durante vários minutos. Já o voo ia longe quando desapareciam.
Com recurso a vários termos técnicos que de facto existem, mas com significados claramente falsos, esta utilizadora explicava que aquele rasto libertado por aquele avião continha metais pesados e era a justificação para muitas das doenças que afetam a população mundial, nomeadamente o cancro. Mais: este fenómeno acontecia porque “eles” tinham o objetivo de debilitar quem vive no planeta. “Eles” não são uma entidade clara. Serão os donos do mundo que nos querem esconder coisas que afetam as nossas vidas e em último caso só nos querem fazer mal para continuarem a controlar o mundo e a ganhar dinheiro. Neste caso em concreto o objetivo das doenças provocadas pelo rasto dos aviões é vender medicamentos para as tratar.
O rasto deixado pelos aviões é bem visível a partir do solo
Mas o rasto dos aviões não é fumo nem tem como objetivo criar doenças nas pessoas, embora não seja inofensivo. Mas já lá vamos. O rasto branco que sai dos motores é um fenómeno que pode ser comparado ao que acontece quando estamos na rua, com temperaturas muito baixas, e sai vapor da nossa boca quando falamos. O ar quente da boca encontra-se com o ar gelado e condensa.
No caso dos aviões, este fenómeno verifica-se quando as aeronaves estão a pelo menos 8km de altitude, zona da atmosfera em que a temperatura pode chegar ao -50ºC. O ar que sai de dentro dos motores pode estar a mais de 300ºC e cria pequenas gotículas de água que rapidamente congelam, formando cristais. A espessura do rasto, bem como o tempo que permanece no céu pode variar consoante a humidade e a temperatura do ar.
Há ainda mais dois dados que podem ajudar a perceber que o que sai dos motores dos aviões não é equivalente ao que sai dos motores dos carros. Durante as aterragens e descolagens é possível verificar que os motores não deitam nada de visível cá para fora. Se é certo que quando o avião está a chegar ao aeroporto os motores estão numa fase de pouco esforço, durante a descolagem acontece exatamente o oposto. Apesar de estar na força máxima, não é visível nenhum rasto de fumo.
A ponta das asas é outro lugar interessante de observar e aqui o fenómeno também se pode verificar durante algumas (raras) aterragens e descolagens. A menos que “eles” não nos queiram dizer, não há qualquer tipo de “escape” na ponta das asas dos aviões, mas o mesmo rasto branco também chega a ser visto por lá. Neste caso a comparação pode ser feita com um barco. Como é bem visível, os barcos empurram a água quando se movimentam, deixando um rasto de água revolta. O mesmo acontece com os aviões. A forma aerodinâmica com que são construídos ajuda-os a empurrar o ar com o nariz, colando-se a toda a estrutura e acabando por ser descarregado nas pontas das asas.
Esclarecido que está este fenómeno, importa também dizer que a indústria aeronáutica é das mais poluentes do mundo. O consumo de combustíveis fósseis é muito expressivo e apesar de várias inovações, ainda não é possível que uma viagem de avião tenha um impacto neutro na atmosfera. E estes rastos de fumo trazem consigo poluição, sim. De acordo com vários estudos, o ar que sai dos motores trás consigo alguns dos elementos associados à queima de combustível e com o aumento do tráfego aéreo (pelo menos antes da pandemia), há vários alertas para que se encontrem forma mais amigas do ambiente para as deslocações.
