A viagem à Ilha do Sal, a ilha mais turística e provavelmente a mais conhecida, de Cabo Verde, surgiu por mero acaso, de forma muito pouco pensada e diria até, de forma absolutamente inesperada e precipitada, apenas e tão só para cumprir uma vontade há muito manifestada pelo meu namorado de umas férias de praia, com tudo incluído. Descanso absoluto, portanto.
De maneira que, no dia 16 de julho, embarquei com destino à Ilha do Sal, desprovida de qualquer expectativa e especial vontade, tendo apenas realizado uma brevíssima pesquisa sobre as principais atrações da ilha, em busca de alguma motivação.
O certo é que, ao segundo dia, estava completamente rendida aos seus encantos.
Poderia falar do fantástico resort onde ficámos alojados, o Riu Funana, dos pontos turísticos do Sal e da sua beleza, como a Buracona e o Olho Azul, ou das experiências simplesmente únicas que vivenciámos como o vislumbrar uma miragem; nadar, flutuar e simplesmente relaxar nas Salinas de Pedra de Lume; deixar-nos tocar e envolver por tubarões bebés na Baía dos Tubarões; assistir à desova das tartarugas Caretta Caretta; provar o típico Grogue; degustar à beira mar um belíssimo peixe fresco ou uma deliciosa cachupa, ou tão simplesmente entrar num mar de um azul incrível e nadar, mas sobre isso já existem imensos textos escritos e sinceramente não foram essas as razões que fizeram com que o Sal fosse tão especial para mim. Foram outras as razões. Outras as belezas.
Apesar deste mar lindíssimo que nos enfeitiça, não considero a Ilha do Sal um lugar propriamente paradisíaco. Trata-se de uma ilha relativamente pequena, árida e pobre, cuja principal fonte de receita é o turismo, e em que, à excepção do peixe, praticamente tudo que é consumido na ilha é importado.
Mas em contrapartida, emana uma energia que irresistivelmente nos atraí e seduz. É o mar. São as pessoas. Com sorrisos rasgados e olhos bem despertos que nos envolvem como que num caloroso e sentido abraço. São os seus corpos, de cores e formas tão diversas, que nos convidam para um funaná e nos desafiam a deixar fluir os movimentos, num ato de verdadeira libertação. É a morabeza. O nome que os Cabo-verdianos dão ao ato de bem receber e que tal como a saudade não se explica, apenas se sente. É no stress, que nos apazigua e nos força a abrandar.
No Sal, dancei (muito), sorri, ri, conheci e descobri. Fui feliz. De verdade.
Mas também chorei. De tristeza. De impotência. Porque pela primeira vez na minha vida saí – física e emocionalmente – da minha zona de conforto e simplesmente me permiti ser e sentir.
Ainda hoje recordo com emoção o momento em que o nosso guia nos levou a conhecer Terra Boa, um dos bairros mais pobres da Ilha do Sal, e em especial a Associação Unidos para o Futuro das Crianças de Terra Boa.
Aqui, o meu coração parou e a minha vida mudou.
Por tudo isso, jamais poderia falar da Ilha do Sal de uma forma exclusivamente turística, porque para mim foi tão mais que isso. Revelou-se uma verdadeira incursão às profundezas do meu ser, sendo que o facto de não ter criado quaisquer expectativas permitiu-me simplesmente estar disponível para receber tudo aquilo que a ilha tinha para me oferecer. E foi incrível.
Ao escrever estas linhas, o meu pensamento voa e estou de novo lá. Sentada à beira mar, a ver o sol pôr-se, a beber uma cerveja servida pelo querido e simpático Endy, com um barco lá ao fundo a dançar ao sabor das ondas. Entretanto, vão chegando os senegaleses Baybay, Pedro e o rapaz do chapéu, repletos de bijuteria e peças de artesanato, e conversamos. Sobre as alegrias e tristezas da vida. Porque no fundo, independentemente da cor e da parte do mundo onde nos encontramos, todos fugimos e todos procuramos o mesmo.
O sol já se pôs, seguimos direções diferentes. Olhamos para trás, uma última vez, para gravar para sempre aquele momento e aquela imagem, e os olhos, verdadeiras janelas d´alma, choram, de sodade.