O ar húmido e quente denunciou a chegada à ilha de Santiago, a maior das dez do arquipélago de Cabo Verde e na qual se encontra a capital, cidade da Praia.
A chuva, rara por estes lados, foi a anfitriã de uma primeira vista pela ilha. Conhecer um local pela primeira vez é colocar todos os sentidos no seu máximo expoente, explorar novos cheiros e renovar a vista a cada nova imagem, mas a chuva trouxe-me as recordações nostálgicas da terra molhada de outras memórias pelo continente Africano.
O Neris esperava-me para me levar direto ao Tarrafal, onde fiquei nos primeiros dias. Vim a Santiago por um misto de trabalho e descanso e então quis aproveitar para conhecer o máximo possível da ilha. O Tarrafal situa-se na parte norte da ilha e sabia que era conhecida por ter as melhores praias de Santiago, mas também por albergar o Campo de Concentração do Tarrafal, símbolo da ditadura e da horrorosa repressão que se viveu no Portugal colonial, mas sobre isso falarei na próxima crónica.
Chegar ao Tarrafal, após quase 2h de caminho por entre estradas sinuosas, mas, em bom estado e após quase 4h de avião, foi como acordar de um desejo há muito sonhado.
Comer um peixe grelhado junto ao mar, acompanhado da Strela, a cerveja local. Mergulhar em águas limpas e claras, de temperatura amena. Respirar o ar puro que chegava desde a Serra da Malagueta e se misturava com os resquícios da chuva que aos poucos se foi desvanecendo.
Ficar embalado pela música das gentes que enchiam a praia naquele final de dia e acompanhados por um pôr do sol magnifico. Arrisco-me a dizer, um dos melhores que já vi na vida.
De um momento para o outro a chuva deu lugar a esse pôr do sol, que a lente de uma câmara nunca conseguirá retratar com total profundidade, e o areal encheu-se de pessoas que aproveitavam o final de semana ao ritmo de muito funaná.
No outro dia, já recomposto da chegada, ao passear pela praia cruzei-me com o Patin e o Tugas, dois jovens de Ribeira Brava que se meteram comigo, perguntando se era português. Respondi que sim, e a partir daí, iniciámos uma animada conversa. Ao ponto de me convidarem para um passeio de barco, porque queriam começar a fazer passeios turísticos no barco que os pais usavam para a pesca e viram ali o “cobaia” ideal.
Algo que aprendi em viagem é que o “Sim” é a medida exacta da distância entre nós e uma experiência que nos pode marcar profundamente. E, talvez por viajar sozinho, estava mais desperto e atento a essa possibilidade.
Acedi ao convite, lançámos o barco ao mar e demos uma volta pela Baía do Tarrafal, primeiro junto ao Farol, onde ao longe pudemos avistar a ilha do Fogo, depois até ao King Fisher, onde se avista a água mais limpa e azul daquela zona e onde aproveitámos para dar uns mergulhos. O Patin ia desenvolvendo alguma conversa e explicando um ou outro pormenor, cuidando sempre de dar instruções ao Tugas, que ia dirigindo a pequena embarcação.
Terminamos a beber uma Strela já na praia e depois de lhes ter agradecido devidamente por aquele momento.
A magia de viajarmos sozinhos é que, na verdade, nunca estamos totalmente sozinhos e conhecer o Patin e o Tugas foi mais uma prova disso.